Milhões de mulheres vivem algumas frustações derivadas de mecanismos que as silenciam e que as
afastam dos centros de poder. O mundo dos antigos gregos e romanos pode nos ajudar a compreender a
construção desses mecanismos. Na fundação da tradição literária ocidental temos o primeiro exemplo registrado
de um homem mandando uma mulher “calar a boca”. Refiro-me à Odisseia de Homero, escrita há quase 3 mil
anos. Tendemos, hoje, a pensar na Odisseia apenas como a épica história de Ulisses e seu retorno para casa
após a Guerra de Troia. Mas a Odisseia é também a história de Telêmaco, filho de Ulisses e Penélope. É a
história do seu crescimento, e de como, ao longo do texto, ele amadurece, passando de menino a homem. Esse
processo surge no primeiro livro do poema, quando Penélope desce de seus aposentos e vai ao grande saguão
do palácio, onde um poeta se apresenta perante a multidão; ele canta as dificuldades encontradas pelos heróis
gregos ao voltar para casa. A música não a agrada, e ela, diante de todos, pede-lhe que escolha outro tema, mais
feliz. Nesse momento, intervém Telêmaco: *— Mãe, volte para seus aposentos e retome seu próprio trabalho, o
tear e a roca. Discursos são coisas de homens, de todos os homens, e minhas, mais que de qualquer outro, pois
meu é o poder nesta casa.”
(Adaptado de Mary Beard, Mulheres e Poder. São Paulo: Planeta. 2018. Edição do Kindle: de Posição 51, 52, 63 e 64.)
Com base na leitura atenta do texto e em seus conhecimentos, responda às questões.
a) Explique um papel social atribuído ao universo masculino e outro atribuído ao universo feminino na
Antiguidade Clássica.
b) De acordo com o texto, por que a Odisseia pode ser revisitada para a compreensão do mundo
contemporâneo?