Rubião fitava a enseada, — eram oito horas da manhã. Quem o
visse, com os polegares metidos no cordão do chambre, à janela de
uma grande casa de Botafogo, cuidaria que ele admirava aquele
pedaço de água quieta; mas em verdade vos digo que pensava em
outra coisa. Cotejava o passado com o presente. Que era, há um
ano? Professor. Que é agora! Capitalista. Olha para si para as
chinelas (umas chinelas de Túnis, que lhe deu recente amigo,
Cristiano Palha), para a casa, para o jardim, para a enseada, para
os morros e para o céu; e tudo, desde as chinelas até o céu, tudo
entra na mesma sensação de propriedade.
— Vejam como Deus escreve direito por linhas tortas, pensa ele. Se
mana Piedade tem casado com Quincas Borba, apenas me daria
uma esperança colateral. Não casou; ambos morreram, e aqui está
tudo comigo; de modo que o que parecia uma desgraça...
Machado de Assis, Quincas Borba.
O primeiro capítulo de Quincas Borba já apresenta ao leitor um
elemento que será fundamental na construção do romance:
(A) a contemplação das paisagens naturais, como se lê em “ele
admirava aquele pedaço de água quieta”.
(B) a presença de um narrador-personagem, como se lê em “em
verdade vos digo que pensava em outra coisa”.
(C) a sobriedade do protagonista ao avaliar o seu percurso,
como se lê em “Cotejava o passado com o presente”.
(D) o sentido místico e fatalista que rege os destinos, como se
lê em “Deus escreve direito por linhas tortas”.
(E) a reversibilidade entre o cômico e o trágico, como se lê em
“de modo que o que parecia uma desgraça...”.