A Casa de Vidro
Houve protestos.
Deram uma bola a cada criança e tempo para brincar.
Elas aprenderam malabarismos incríveis e algumas
viajavam pelo mundo exibindo sua alegre habilidade.
(O problema é que muitos, a maioria, não tinham jeito e
eram feios de noite, assustadores. Seria melhor prender
essa gente — havia quem dissesse.)
Houve protestos.
Aumentaram o preço da carne, liberaram os preços
dos cereais e abriram crédito a juros baixos para o
agricultor. O dinheiro que sobrasse, bem, digamos, ora o
dinheiro que sobrasse!
Houve protestos.
Diminuíram os salários (infelizmente aumentou o
número de assaltos) porque precisamos combater a
inflação e, como se sabe, quando os salários estão acima
do índice de produtividade eles se tornam altamente
inflacionários, de modo que.
Houve protestos.
Proibiram os protestos.
E no lugar dos protestos nasceu o ódio. Então surgiu
a Casa de Vidro, para acabar com aquele ódio.
ÂNGELO, |. A casa de vidro. São Paulo: Círculo do Livro, 1985.
Publicado em 1979, o texto compartilha com outras obras
da literatura brasileira escritas no período as marcas do
contexto em que foi produzido, como a
@® referência à censura e à opressão para alegorizar
a falta de liberdade de expressão característica
da época.
O valorização de situações do cotidiano para atenuar
os sentimentos de revolta em relação ao governo
instituído.
O utilização de metáforas e ironias para expressar um
olhar crítico em relação à situação social e política
do pais.
(O) tendência realista para documentar com
verossimilhança o drama da população brasileira
durante o Regime Militar.
O sobreposição das manifestações populares pelo
discurso oficial para destacar o autoritarismo do
momento histórico.