Catar feijão
Catar feijão se limita com escrever:
jogam-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na da folha de papel;
e depois, joga-se fora o que boiar.
Certo, toda palavra boiará no papel,
água congelada, por chumbo seu verbo:
pois para catar esse feijão, soprar nele,
e jogar fora o leve e oco, palha e eco.
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Ora, nesse catar feijão entra um risco:
o de que entre os grãos pesados entre
um grão qualquer, pedra ou indigesto,
um grão imastigável, de quebrar dente.
Certo não, quando ao catar palavras:
a pedra dá à frase seu grão mais vivo:
obstrui a leitura fluviante, flutual,
açula a atenção, isca-a como o risco.
MELO NETO, João Cabral de. Obra Completa.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994; pp. 346-347.
a) No terceiro verso da primeira estrofe do poema de João Cabral de Melo Neto, há uma construção com um termo
elíptico.
i) Identifique o termo que foi omitido;
ii) Explique o efeito que tal omissão confere ao poema.
b) Explique por que a forma “entre” constitui duas palavras distintas em “o de que entre os grãos pesados entre”.