O poema “Legado” integra a primeira parte do livro Claro enigma (1951), a que o
autor denominou “Entre lobo e cão”.
Legado
Que lembrança darei ao país que me deu
tudo que lembro e sei, tudo quanto senti?
Na noite do sem-fim, breve o tempo esqueceu
minha incerta medalha, e a meu nome se ri.
E mereço esperar mais do que os outros, eu?
Tu não me enganas, mundo, e não te engano a ti
Esses monstros atuais, não os cativa Orfeu,
a vagar, taciturno, entre o talvez e o se.
Não deixarei de mim nenhum canto radioso,
uma voz matinal palpitando na bruma
e que arranque de alguém seu mais secreto espinho.
De tudo quanto foi meu passo caprichoso
na vida, restará, pois o resto se esfuma,
uma pedra que havia em meio do caminho.
ANDRADE, Carlos Drummond de, Claro enigma. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 19.
Considerando o poema, sua relação com o livro, e a poética de Carlos Drummond de
Andrade, assinale a alternativa correta.
a) O livro Claro enigma é considerado pela crítica como um marco na redefinição da poesia de
Drummond por instaurar diálogo com as poéticas clássicas.
b) Se anos antes Drummond havia escrito “no meio do caminho tinha uma pedra”, no verso
final de “Legado” observa-se a opção por uma expressão mais coloquial.
c) O poema “Legado” tematiza a identidade nacional, vinculando-se aos modelos e
perspectivas próprios do movimento Antropofágico.
d) O poema “Legado” tematiza a inconstância do eu do poeta e das coisas do mundo e
inaugura a vertente autobiográfica da poesia de Drummond
e) O último terceto trai a norma clássica de um soneto, pois apresenta a sintese do poema, da
biografia e da trajetória poética de Carlos Drummond de Andrade.