Leia o seguinte trecho da obra Terra Sonâmbula, de Mia
Couto, extraído do Sexto caderno de Kindzu, subintitulado
O regresso a Matimati.
Lembrei meu pai, sua palavra sempre azeda: agora, somos
um povo de mendigos, nem temos onde cair vivos. Era
como se ainda escutasse:
- Mas você, meu filho, não se meta a mudar os destinos.
Afinal, eu contrariava suas mandanças. Fossem os
naparamas, fosse o filho de Farida: eu não estava a deixar
o tempo quieto. Talvez, quem sabe, cumprisse o que
sempre fora: sonhador de lembranças, inventor de
verdades. Um sonâmbulo passeando entre o fogo. Um
sonâmbulo como a terra em que nascera. Ou como
aquelas fogueiras por entre as quais eu abria caminho no
areal.
(Mia Couto, Terra Sonâmbula. São Paulo: Companhia de Bolso, 2015,
p. 104.)